A mala de António Zambujo tem trazido, pelo país (e mundo) fora, as canções de um álbum que se tornou referência. Um trabalho que desabotoou o fado e cruzou-o com o jazz. Chama-se Quinto e, há exactamente um ano atrás, emDezembro de 2012, era apresentado numa das mais emblemáticas salas do país, o Coliseu dos Recreios. Agora, essa noite inesquecível está guardada em Lisboa 22:38, o seu primeiro registo ao vivo.
E a razão pela qual, doze meses depois, continuamos a querer revisitar esse momento, tem muito a ver com o percurso deQuinto, que foi lançado em Abril de 2012, actualmente é Disco de Platina e continua nos primeiros lugares do Top Nacional de Vendas.
O caminho de Zambujo encontra-se com o de outros nomes que, em especial nos últimos anos, têm definido a música portuguesa. É o caso de Pedro da Silva Martins, dos Deolinda, ou Miguel Araújo, dos Azeitonas. Essas contribuições juntam-se à sua vontade de fazer diferente e assim, encontram-se novas abordagens. E é com elas que tem viajado. Pela Europa, pelos Estados Unidos e especialmente pelo Brasil, país de grandes personalidades que se confessaram fãs, de Vanessa da Mata a Jô Soares. Dizia Caetano Veloso que o que se ouve em Zambujo é algo já que vai mais fundo. É um jovem cantor de fado que, intensificando mais a tradição do que muitos de seus contemporâneos, faz pensar em João Gilberto e em tudo que veio à música brasileira por causa dele."
Mas primeiro, a sua história: Cresceu a ouvir o cante alentejano. A harmonia das vozes, a cadência das frases e o tempo de cada andamento, foram para sempre uma influência. Nascido em Beja, em 1975, António Zambujo começou a estudar clarinete com 8 anos, estreando-se no Conservatório Regional do Baixo Alentejo.
Ainda pequeno, apaixonou-se pelo Fado e pelas vozes de Amália Rodrigues, Maria Teresa de Noronha, Alfredo Marceneiro, João Ferreira Rosa, Max entre muitos outros. Estava habituado a cantar em família e entre amigos, e aos 16 anos chegou mesmo a ganhar um concurso de fado.
Com o curso de clarinete na bagagem, ruma a Lisboa, onde Mário Pacheco, intérprete e compositor de guitarra portuguesa lhe abre a porta do conhecido Clube do Fado, no bairro de Alfama, onde passou a tocar. Pouco depois, integra o musical Amália, dirigido por Filipe La Féria. Durante os quatro anos que o espectáculo esteve em cartaz primeiro no Teatro Politeama, depois um pouco por todo o país , Zambujointerpreta o papel de Francisco Cruz, o primeiro marido de Amália.
O seu primeiro trabalho, O Mesmo Fado, é editado em 2002, com marcadas influências musicais do Alentejo e fados compostos por si e por conhecidos poetas do universo fadista, como José Luís Gordo ou Mário Raínho.
Nos anos seguintes, Zambujo canta na casa de fado Sr. Vinho, local que lhe deu uma importante exposição. Para lá de Portugal, os seus concertos chegam regularmente a cidades como Toronto, Paris, Santander, Sarajevo ou Zagreb.
2004 é o ano de Por Meu Cante, um trabalho em que aprofunda as suas raízes e recupera temas do Cancioneiro de Beja, com a colaboração dos músicos Paulo Parreira (guitarra portuguesa) e Ricardo Cruz (contrabaixo).
O Prémio Amália Rodrigues, atribuído pela Fundação que desenvolve a herança cultural da fadista, é-lhe atribuído em 2006 na categoria de "Melhor Intérprete Masculino de Fado", pela mesma altura em que é convidado pela Fundação Calouste Gulbenkian para o festival Atlantic Waves, em Londres, e pela Festa do Avante para uma homenagem ao compositor Alain Oulman, grande responsável por alguns dos maiores sucessos de Amália.
Outro Sentido, o seu terceiro disco, é lançado em 2007, com produção de Ricardo Cruz, ganhando em 2008 uma edição internacional e um reconhecimento, pela revista Songlines, como Top of the World Album. Sucedem-se assim as distinções e actuações, e por isso, também, Zambujo começa a construir um público cada vez mais alargado. Até no Brasil, onde acaba por gravar ao lado de Roberta Sá, Zé Renato e Ivan Lins. Em casa, fecha o ano com dois concertos esgotados no Teatro São Luiz e a preparação de uma nova digressão que, em 2009, chega às páginas da imprensa mundial.
Guia marca o seu regresso aos discos, em Abril de 2010, interpretando composições próprias, mas também de letristas nacionais e brasileiros, como Vinicius de Moraes, Márcio Faraco, Pierre Aderne, Rodrigo Maranhão, Ricardo Cruz, João Gil, João Monge, Aldina Duarte, José Agualusa, entre outros. Do Rock in Rio à Aula Magna, da Casa da Música aos Jardins do Palácio de Belém, do Womex de Londres à Semana Cultural Portuguesa em Espanha, Zambujo demonstra a sua força ao vivo em nova digressão. Jornalistas dos mais diversos meios, dos jornais diários às revistas da especialidade, destacamGuia como um dos principais álbuns do ano.
Ainda em 2010, partilha o palco do Grande Auditório da Culturgest com o Rancho Cantadores da Aldeia Nova de São Bento, antes de viajar pela primeira vez para os Estados Unidos e Canadá.
Pode realmente dizer-se que António Zambujo partiu do Alentejo para o Mundo. Não só porque o Fado é uma das nossas mais importantes exportações, mas porque, em nome próprio, conseguiu levá-lo a novos horizontes, novas sonoridades. O resumo de tudo isto chama-se, já o dissemos,Quinto. E o resumo da sua vida em palco, esse chama-seLisboa 22:38, a hora a que, na noite de 7 de Dezembro de 2012, se baixavam as luzes do Coliseu dos Recreios, a mítica sala de Lisboa. E nas palavras do jornalista João Miguel Tavares, a partir de agora e deste disco, a sala é a de cada um.